No imaginário popular, a coisa de rico é facilmente associada a mansões, carros de luxo e viagens exóticas. Mas o que realmente define a riqueza no Brasil? E, mais importante, quem se considera rico em um país de tantas desigualdades? O antropólogo Michel Alcoforado nos convida a explorar essas questões em seu instigante livro “Coisa de Rico: A vida dos endinheirados brasileiros”, uma obra que promete um mergulho preciso e mordaz no mundo das elites.
A Inatingível “Coisa de Rico”: Sempre o Outro
Uma das constatações mais intrigantes de Alcoforado é que, para boa parte dos endinheirados brasileiros, a riqueza é sempre uma coisa de rico que pertence a outra pessoa. Não há um critério absoluto; sempre haverá alguém com mais dinheiro, mais pompa, mais patrimônio, mais próximo do topo da pirâmide social. Essa percepção elusiva da própria riqueza é o ponto de partida para uma análise profunda e cheia de humor.
Com uma precisão cirúrgica e um olhar antropológico afiado, Alcoforado desvenda os códigos, as nuances e as contradições de uma parcela da sociedade que, mesmo nadando em dinheiro, raramente se reconhece como parte da elite. Sua vasta experiência como “antropólogo do luxo” permite que ele nos apresente tipos facilmente identificáveis, que transitam entre o caricato e o profundamente real:
• O casal emergente da Barra da Tijuca, com suas viagens a Miami para renovar o guarda-roupa de grife, buscando incessantemente a próxima coisa de rico.
• A herdeira de uma família tradicional, que prefere a discrição da Suíça aos holofotes brasileiros, vivendo uma coisa de rico mais reservada.
• O embaixador carioca, nostálgico de um Itamaraty que, em sua visão, perdeu o brilho com a democratização do acesso, lamentando a perda de uma certa coisa de rico tradicional.
Além da Conta Bancária: Os Códigos da Riqueza
“Coisa de Rico” vai muito além da superficialidade da conta bancária. Alcoforado revela que, para além de um certo patamar financeiro, o que realmente importa para essa elite são os códigos sociais, os rituais e as redes de contato que precisam ser dominados para pertencer às “altas rodas”. É um jogo de aparências, de pertencimento e de distinção, onde o dinheiro é apenas uma das moedas de troca para acessar a verdadeira coisa de rico: o status e o reconhecimento social.
O autor traduz um vasto repertório antropológico em uma descrição analítica e cheia de humor, mostrando como a busca por esses códigos e a constante comparação com “o outro” moldam a vida e as percepções dos endinheirados. A coisa de rico não é apenas ter, mas saber ser e pertencer.
Uma Leitura Essencial para Entender o Brasil
Se você busca uma leitura que combine rigor antropológico com uma narrativa envolvente e cheia de insights, “Coisa de Rico” é um prato cheio. Prepare-se para rir, refletir e, talvez, reconhecer um pouco de si ou de seus conhecidos nesse retrato tão fiel quanto impiedoso da riqueza no Brasil. Uma obra essencial para entender as complexas dinâmicas sociais e econômicas do nosso país e, finalmente, compreender o que realmente significa essa tal de coisa de rico.
